Odeio quando faz frio. Um dia frio é triste e frustrante como quem consegue segurar o choro ou qualquer outra expressão de infelicidade, ou como se, de repente, tudo a sua volta o torturasse até que você, assim como o resto do universo, se sinta infinitamente inferior às nuvens calcinadas no alto. Não é que todos os dias frios em Recife sejam tristes, mas nós recifenses não somos acostumados a não ver azul claro no céu, nem sair de casa com um guarda-chuva – se acaso chover, nem usar roupas-de-friozinho, nem nada que se faz quando se tem frio. Nós nem estamos acostumados a sentir frio. Também não gostamos de nos sentir intimidados pelo cinza que cobre a cidade e nos torna claustrofóbicos e idênticos, perdidos e incolores. E, é claro, definitivamente não gostamos de chuva. A chuva empoça as ruas que são baixas e raramente saneadas, molha as roupas do varal, derruba os morros e as barragens, fecha as janelas e faz do trânsito um caos mesmo que você sempre tenha a impressão de que ninguém vai sair de casa porque está chovendo. Na verdade, a chuva muitas vezes é um grande argumento para faltar ao trabalho ou a escola, ou seja, não temos a menor idéia de como lidar com ela.
sábado, 6 de novembro de 2010
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
FIM DA TARDE
domingo, 19 de setembro de 2010
LINHA
terça-feira, 14 de setembro de 2010
O PASSADO
O passado é uma sala clara, mas carregada de sal de prata e lama em forma de pegadas. É um livro cheio de orelhas. É a tinta pra caiar a casa, o balão sem ar quente, a garrafa lacrada, é o estojo de lápis de cor. Cabelo no chão, folhas do calendário de um ano antigo, roupas que não cabem mais, tesouras cegas, cheiros que não estão presentes. Aquilo que está além das costas. O passado é só matéria prima.
O presente é o ato. O futuro é o resultado.
sexta-feira, 30 de julho de 2010
segunda-feira, 5 de julho de 2010
HOMEM, IV
terça-feira, 15 de junho de 2010
quinta-feira, 27 de maio de 2010
TÃO MEU
quarta-feira, 26 de maio de 2010
segunda-feira, 24 de maio de 2010
terça-feira, 6 de abril de 2010
domingo, 21 de março de 2010
& DARLING
quarta-feira, 17 de março de 2010
DOS DIAS QUENTES
Era assim: minha hora preferida do dia tinha se tornado justamente a hora de ir ao colégio porque, encostado na placa, eu espiava o início da avenida, ansiando não a chegada de um ônibus, mas a de uma bicicleta amarela com cara de tesouro-de-brechó, passeando devagar pelos carros acordados, colorindo por onde passava ao passo que ia abrindo meus olhos antes pregados de sono, agora brilhantes vivos; ia acendendo meu corpo; ia me dando bom dia; ia afastando o frio; ia... ia... ia... Contudo, a bicicleta, em si, pouco me interessava. O que me cativava era seu condutor de barba rala, de olhos boêmios, de roupas amassadas. Um par de classic reeboks coloridos, um jeito meio Vênus meio Marte, uma beleza maldosa, arisca, castelhana, parecia que tinha saído de um filme de Pedro Almodóvar.
Era assim e só assim eu podia enfrentar mais uma manhã de pré-vestibulando fodido, num dia frio e cansado e opaco e triste como todos os outros dias de junho, de julho, de agosto. Era assim que eu ia sorrir pelo menos por breves momentos na sala de aula, na mesa de estudos, no curso, na academia, no inglês.
E será que ele gosta de meninos? – ficava me perguntando horas, tentando me convencer de que ele era só mais um cara normal igual a todos os outros. Depois cedia, criava toda uma história pro cara, pensava que ele tinha um amor mal correspondido por outro ciclista, de vez em quando era pelo médico que cuidou do joelho dele uma vez que ele caiu da bicicleta e até mesmo pelo vendedor de correias... Claro que minha história favorita era aquela em que ele era louco pelo garoto magrela da parada na avenida principal. Me dava uma prazer enorme pensar que ele era gay, pensar que ele estava ao meu alcance. Mas ele não parecia ser. Mesmo assim, eu me prendia a sua bicicleta amarela e ao tênis colorido – classic reebok, tinha que ser importado.
Veja bem, não é à toa que descrevo esta memória infantil. Ela pode ter uma moral, ou sei lá como se chama coisas assim. O fato é que, certo dia, mais um dia qualquer, ele cruzou a avenida e, dessa vez, tudo ficou claro, quente, feliz, euforia pra durar uma semana: ele passara sorrindo pra mim.